O Instituto Municipal Philippe Pinel, vinculado à Secretaria Municipal de Saúde, desenvolve desde 2000 o Projeto Papel Pinel. Os usuários do serviço de saúde mental do hospital, localizado em Botafogo, Zonal Sul da Cidade, confeccionam caixas, blocos de anotações, agendas, cadernos e outros produtos com papel reciclado. Em meio a tintas, pincéis, cola, água e muita imaginação, 23 pacientes encontram na arte a recuperação da sua auto-estima e mantêm os vínculos de convívio social.

O projeto nasceu da necessidade de ampliar as atividades da Cooperativa da Praia Vermelha, que fabricava biscoitos. No início, a oficina tinha apenas cinco participantes e o nome era Sonharte do Papel Vivo, dado por um deles. O primeiro produto foi um cartão postal. A idéia era pegar todo e qualquer tipo de papel jogado no lixo e transformá-lo em reciclado. O trabalho foi contagiando os funcionários de outros setores do Pinel. Até bulas de remédios passaram a ser guardadas. Tudo o que era descartado servia de matéria-prima.

Oito anos depois, as oficinas tornaram-se atividades de inclusão social. A iniciativa reafirma o conceito da reforma psiquiátrica, que busca novas maneiras de tratar o doente mental, deixando para trás o confinamento e o eletrochoque. Esther Marco Wenna, 54 anos, coordenadora do projeto, destaca sua importância no tratamento dos pacientes. “Meu trabalho não é com o papel e sim com a pessoa. Sinto prazer quando eles dizem que estão vindo trabalhar”, conta orgulhosa.

Qualidade garante vendas

A qualidade fez com que os produtos ganhassem visibilidade, passando a ser vendidos em congressos médicos e pontos espalhados pelo Rio de Janeiro, como o Jardim Botânico e livrarias. Algumas parcerias com organizações não-governamentais foram surgindo. Por meio de uma delas, o nome do Papel Pinel chegou a um programa de TV, cujos participantes receberam camisetas com a logomarca do Projeto, idealizada na oficina de criação.

Atualmente, a fábrica é uma grife com marca registrada e conta com a parceria de empresas. O Papel Pinel possibilitou a criação de uma nova frente de trabalho e geração de renda. Uma parte dos recursos financeiros arrecadados com a venda dos produtos é usada para compra de material. A outra é destinada aos pacientes, na forma de salário simbólico. Segundo Esther Wenna, “um deles chegou a ganhar R$ 500, por ter trabalhado das 8h às 23h durante um mês”.

 

Lições de vida e superação

Uma das pacientes mais empolgadas com o projeto é Rosibel Pinto de Sousa, 46 anos. Ela conta que já teve emprego com carteira assinada e vida estável, até que surgiram os distúrbios nervosos. Desde 2004, é atendida no Instituto Pinel. E isso mudou sua vida. “Quando cheguei aqui, eu queria papel e lápis de cor. Através do desenho, eu desabafo as coisas da minha vida. Agora sou mais extrovertida e consigo me relacionar melhor com as pessoas”, relata. Rosibel mal consegue descrever o que sente ao ver um produto feito por ela sendo vendido. “É uma realização muito grande quando vejo meu trabalho valorizado”, emociona-se.

“O hospital está me dando a sensação de cura.” É assim que João Batista dos Santos, 52 anos, define sua relação com o Projeto Papel Pinel. Ele decora versos de Fernando Pessoa e outros poetas, que servem de inspiração para os desenhos, misturando cores e traços. “Eu era muito tímido. Por causa do meu problema mental, tinha medo de me aproximar das pessoas. Aos poucos, fui perdendo o receio e hoje sou uma pessoa feliz”, diz.

Ricardo Azevedo é outro exemplo de superação. Aos 25 anos, teve uma crise nervosa e precisou ser internado. Passou quatro dias no Hospital Pinel e logo voltou para casa. Por intermédio de uma amiga, conheceu a coordenadora do projeto, que o levou para trabalhar como auxiliar administrativo. Hoje com 47 anos, Ricardo é “braço direito” de Esther e leva consigo uma lição de vida. “O que eu mais aprendi com este projeto é saber conviver com as diferenças. Meu lema é igual ao do Papel Pinel: recicle idéias, jogue fora preconceitos.”

Daniel Braga, 30 anos, é um artista “que viaja consciente”, como ele se define. Tem um blog na internet e é autor de músicas e vídeos. Ele procurou o Papel Pinel motivado por uma reportagem exibida em um canal de TV a cabo. “Eu não saía de casa. Não tinha amigos e estava à margem da sociedade. Hoje, tenho verdadeiros amigos e eles me entendem”, diz. E acrescenta com alegria que dois quadros de sua autoria foram vendidos em uma exposição.

Recentemente, o Papel Pinel ganhou o Prêmio Cultura Nota 10, oferecido pela Unesco e algumas empresas privadas, que destacou 21 experiências inovadoras em todo o Estado do Rio de Janeiro. Ano passado, a Secretaria Municipal de Saúde fez uma doação de materiais de desenho para o projeto.

O Papel Pinel está à disposição de quem queira juntar-se aos “guerreiros do papel”, como os participantes do projeto gostam de ser chamados. Basta procurar o ambulatório do Instituto Municipal Philippe Pinel, na Avenida Venceslau Brás, 65, em Botafogo, de segunda a sexta-feira, das 12h às 17h. O telefone é 2542-3049, ramal 2087.

Texto: Carolina Perez (estagiária da SECS)
Fotos: Alberto Jacob (SECS)

 

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