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COMEMORAÇÃO
DO CENTENÁRIO DO PINTOR CÂNDIDO PORTINARI
Entrevista
com o Professor João Cândido Portinari
Diretor do Projeto Portinari desde 1979. Professor doutor pelo
MIT nos Estados Unidos. Criador e primeiro diretor do Departamento
de Matemática da PUC-RJ.
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FRASES
"Ele carregava dentro de si uma missão social, humana,
que era a missão de passar valores através da sua arte."
"Eu
acho que isso veio ao encotro a uma carência, a um desejo reprimido
muitos anos de um encontro com a nacionalidde".
"A
imagem é realmente uma linguagem natural para essas crianças".
"Uma
pessoa comprometida com o ser humano, principalmente pelo ser humano que
sofre".
"Ele
fez um grande crônica da nação brasileira".
"Então,
era um homem de uma imensa ternura".
ENTREVISTA
1)
O que significa para o senhor ser filho de Cândido Portinari?
Uma grande honra. Um grande orgulho. De ser seu filho
e de ser brasileiro. Porque um pintor que retratou o nosso país
como ele retratou, com emoção, com essa missão de
passar valores sociais, valores humanos em sua obra...
Uma coisa que a gente sente quando trabalha todos esses anos aqui no Projeto
Portinari é que ele não foi um pintor apenas por pintar,
não é? Ele não pintou apenas por preocupações
estéticas ou especulações intelectuais, como tantos
pintores fazem. Ele carregava dentro de si uma missão social, humana,
que era a missão de passar valores através da sua arte.
Valores de não violência, de fraternidade, valores de espírito
comunitário, de respeito à pessoa humana, à dignidade
do ser humano. Então, tudo isso faz com que a gente se orgulhe
muito de estar fazendo esse trabalho, de estar podendo passar esses valores,
principalmente para as crianças.
2)
E isso a gente está vendo aqui, esse retorno.
É
extraordinário, não é professora? Eu estou achando
uma coisa realmente extraordinária o que esta acontecendo no Brasil
todo. Nós estamos recebendo uma avalanche de e-mails de todos os
cantos do Brasil. De professores, alunos, pais, que estão fazendo
trabalhos sobre Portinari. E como isso está mobilizando esse público.
3)
É, sem dúvida. É uma coisa impressionante como despertou
a vontade do brasileiro de conhecer mais Portinari.
Eu
acho que isso veio ao encontro a uma carência, a um desejo reprimido
muitos anos de encontro com a nacionalidade. Um encontro verdadeiro, autêntico,
como se o gigante adormecido tivesse acordado agora.
4)
É verdade. E a gente percebe que, de uma maneira geral, para os
alunos da rede municipal que têm nos visitado, a pintura mais marcante
é a dos cafeicultores. E, incrível, é pelos pés
grandes. Eles interpretam aquilo muito bem .
Eu
também tenho ficado muito surpreso, muito admirado. Tenho visitado
escolas de crianças de até 3 anos, outras com 8 anos. É
incrível a capacidade que eles têm de assimilar esses conteúdos,
de vibrar, de compreender. A imagem é realmente uma linguagem natural
para essas crianças.
5)
Eu tinha até uma pergunta que é como o senhor definiria
o cidadão Cândido Portinari, mas acho que já está
embutida no que a gente está falando.
Eu
acho que é uma pessoa ... a palavra que me ocorre é o compromisso.
Uma pessoa comprometida com o ser humano. Com a compaixão por todo
ser humano e, principalmente, pelo ser humano que sofre. A gente sente
isso claramente nas obras dele. Essa compaixão por tudo que existe.
Essa reverência pelo sagrado que há na vida.
6)
E eu acho que é importante também porque o aluno passa a
ter uma noção um pouco melhor da cultura de nosso país,
através da pintura.
Esse
é outro aspecto que eu ia lhe dizer. Esses aspectos que nós
estávamos falando são mais universais, que se aplicam a
qualquer país. Agora, além disso, ele fêz uma grande
crônica da nação brasileira. Passando por todos os
temas, temas sociais, históricos, religiosos, a festa popular,
os tipos populares, o trabalho no campo e na cidade, a infância,
os animais, a paisagem. É um grande retrato, uma grande síntese
emociada e crítica da realidade brasileira.
7)
Sem dúvida e muito atual também.
E
muito atual, é.
8)
Passando um pouquinho só para a parte mais afetiva, qual a pintura
do seu pai que o senhor mais aprecia?
Olha,
tem várias. É difícil dizer uma só, mais tem
uma menininha, o título é "Menina Sentada". Ela
tem um vestido de chita, é uma moreninha que tem uma fitinha no
cabelo. Eu tenho paixão por esse quadro. Ela tem um vestido de
chita com uns pontinhos.
9)
Essa menina não é alguém assim próximo, não?
Não,
é uma menina representando uma menina do povo. Inclusive, eu fui
numa escola, aquela, Escola Municipal Edumundo Bitencourt, lá no
Pedregulho, onde tem os azuleijos do Portinari. As crianças estavam
querendo me entrevistar. Fui para uma sala e elas estavam lá, com
as perguntas já preparadas, anotadas. E foram fazendo as perguntas.
Aí, uma menininha, exatamente como essa que eu lhe descrevi, virou-se
para mim e disse assim: " O que que seu pai mais gostava de pintar?"
Eu olhei para ela e falei: "Você. Ele gostava de pintar você.
Exatamente assim." É isso mesmo. É a pura verdade.
10)
Dr. João, só para terminar, qual a lembrança mais
marcante que o senhor tem de seu pai?
Olha,
eu tenho a impressão de que é a mão dele na minha
testa, quando eu estava febril. Era uma coisa que me dava uma paz inesquecível.
Porque ele tinha essa preocupação! Quando vejo os retratos
da minha infância, estou sempre pendurado no pescoço dele.
Então, era um homem de uma imensa ternura. É isso que eu
lembro, de uma imensa ternura.
11)
Muito obrigada, foi lindo!
Eu que
agradeço, professora, por essa oportunidade.
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